REGIME TRANSITÓRIO PARA DECLARAÇÕES DE IRS DE 2015 FORA DE PRAZO COM TRIBUTAÇÃO CONJUNTA
Depois de alguns meses de espera, foi finalmente publicado o regime transitório de opção pela tributação conjunta, em declarações de IRS relativas ao ano de 2015 entregues fora dos prazos legalmente previstos.
Como foi amplamente divulgado, na reforma do Código do IRS operada para 2015, os contribuintes casados ou unidos de facto passaram a ser tributados pelo regime da tributação separada (uma declaração para ca cônjuge), que assim se assumiu como regime regra. Aqueles contribuintes podiam exercer a opção pela tributação conjunta, desde que feita em declaração de rendimentos entregue dentro do prazo legal. Estava proibido o exercício desta opção em declarações entregues fora do prazo. A situação já foi corrigida no Orçamento do Estado para 2017, permitindo-se sempre a opção pela tributação conjunta, já com efeito nas declarações a entregar para o ano de 2016, mesmo que venham a ser entregues fora do prazo legal.
Por desconhecimento daquela “armadilha”, ou por qualquer outro motivo que tenha levado à entrega para além do prazo, muitos contribuintes viram-se prejudicados em centenas ou mesmo milhares de euros, porque já não lhes foi possível escolher a tributação conjunta, que lhes seria mais favorável, no seu IRS de 2015.
Este regime, constante da Lei n.º 3/2017 de 16 de janeiro, vem permitir corrigir e/ou anular a penalização excessiva para as famílias a quem foi imposto o regime da tributação separada e aplica -se aos sujeitos passivos casados ou unidos de facto que, estando em condições substanciais para o fazer, pretendam ser tributados pelo regime da tributação conjunta, ainda que tenham exercido ou venham a exercer essa opção fora dos prazos previstos para a entrega da declaração de 2015 (durante o mês de abril de 2016 para IRS da primeira fase, e durante o mês de maio para a segunda).
As situações mais frequentes que podem ser corrigidas contemplam:
CENÁRIO 1 – Contribuintes que entregaram a sua declaração fora de prazo, com opção por tributação conjunta, e a mesma ainda está por liquidar, constando com divergência no sistema da Autoridade Tributária (AT).
Nestes casos, os contribuintes não necessitam de efetuar qualquer procedimento, pois está previsto que a AT faça a correção oficiosa deste erro e liquide as declarações. Não foi definido prazo para esta liquidação pelo que recomendamos aguardar pelo menos um mês. Caso verifique que a sua declaração continua em divergência, poderá pedir esclarecimentos presencialmente no Serviço de Finanças ou através do e-balcão.
CENÁRIO 2 – Contribuintes que entregaram a sua declaração fora de prazo, com opção por tributação conjunta e, depois de notificados da divergência que esta gerou, optaram por entregar uma declaração com tributação separada por cada um dos cônjuges ou unidos de facto.
CENÁRIO 3 – Contribuintes casados ou unidos de facto que entregaram as suas declarações dentro do prazo, com regime de tributação separada, mas entretanto constataram que a opção por tributação conjunta seria mais favorável, mas não entregaram ainda declaração de substituição.
CENÁRIO 4 – Sujeitos passivos casados ou unidos de facto que até à data ainda não entregaram qualquer declaração de IRS para o ano de 2015.
Para os sujeitos passivos que se enquadrem nos cenários 2, 3 e 4, caso seja do seu interesse, podem entregar uma declaração de IRS com opção pela tributação conjunta, ao abrigo deste regime, até 30 de abril de 2018 (modelo 3 da primeira fase) ou até 31 de maio de 2018 (modelo 3 da segunda fase).
Por esta entrega (ou regularização da situação) fora de prazo, só será aplicada coima às declarações apresentadas como primeira declaração relativa ao ano de 2015.
Os sujeitos passivos que exerçam agora a opção de tributação conjunta podem requerer a suspensão do processo executivo que tenha sido instaurado, em virtude do não pagamento de nota de cobrança do IRS de 2015, com base em declaração liquidada no regime da tributação separada. Para o efeito, não será necessária a apresentação de garantia. Se tem ainda IRS por pagar, liquidado nestas condições, fica assim com menos uma preocupação, desde que exerça a opção pela tributação conjunta e requeira a suspensão do processo.
E quem já pagou o IRS liquidado em tributação separada, na totalidade ou apenas parte?
Entrega agora nova declaração com tributação conjunta e aguarda a compensação das liquidações que lhe devolverá o IRS pago a mais, juntamente com eventual reembolso a que tenha direito. A lei nada refere sobre isto, nem tal é necessário. Situações de modelos 3 liquidadas e com imposto pago, depois substituídas por outra declaração que origina reembolso desse imposto (ou de parte) já aconteciam por motivos variados. E há legislação que prevê que seja feita a compensação entre as sucessivas liquidações de IRS, e o imposto já pago, para apuramento do saldo global.
As novidades aqui terão apenas a ver com a possível existência de duas liquidações (uma de cada SP do casal) que deverão ser compensadas com a declaração de substituição, e eventualmente estar a decorrer um plano de pagamento em prestações. Casos que certamente vão exigir intervenção de um operador, que “dirá” ao sistema informático quais as liquidações (e pagamentos já feitos) a compensar.
FORMAS DE TRIBUTAÇÃO EM IRS DOS RENDIMENTOS OBTIDOS POR SUJEITOS PASSIVOS RESIDENTES E BREVE ANÁLISE DAS OPÇÕES DE ENGLOBAMENTO
A reforma da tributação das pessoas singulares operada em 1989 introduziu o IRS com a sua grande inovação de ser um imposto global e único. Objetivo: sujeitar os rendimentos líquidos das várias categorias então estabelecidas a uma única tabela de taxas progressivas, por oposição ao sistema até então vigente de impostos cedulares secundados por um imposto complementar.
No preâmbulo do CIRS pode ler-se:
“À luz das modernas exigências de equidade, a solução unitária é inequivocamente superior quer ao puro sistema cedular, consistindo este em impostos separados e entre si não articulados, incidentes sobre as diferentes fontes de rendimento, quer ao próprio sistema compósito, resultante, em regra, de evolução operada a partir de uma estrutura originariamente cedular, em que a um esquema de impostos parcelares se sobrepõe uma tributação de segundo grau com carácter global.
Na verdade, só a perspetiva unitária permite a distribuição da carga fiscal segundo um esquema racional de progressividade, em consonância com a capacidade contributiva.”
Contudo, outras imposições legais e diferentes pretensões impediram, desde logo, que estes objetivos fossem plenamente conseguidos. Atente-se na orientação adotada no que respeita aos rendimentos de títulos ao portador e aos juros de depósitos bancários, em face do regime de anonimato existente, considerando-se conveniente prever, nestes casos, a aplicação de taxas liberatórias [na altura, de 20%], com a possibilidade de opção pela globalização, caso o contribuinte se disponha a revelar os rendimentos auferidos”. Por outro lado, a inclusão na incidência real do IRS de rendimentos até aí não tributados levou à criação de taxas especiais. Consagrou-se a tributação dos ganhos pela transmissão onerosa de partes sociais e outros valores mobiliários, com uma solução ajustada em função do objetivo da política de desenvolvimento do mercado financeiro, fixando-se, para este caso, uma taxa liberatória de 10%, mas também com a possibilidade de o sujeito passivo optar pelo englobamento.
E a que é que fomos assistindo nestes quase 30 anos de sucessivas modificações no CIRS?
Se por um lado se mantém a estrutura de um imposto global, que sujeita um conjunto significativo de rendimentos a taxas progressivas, por outro foram-se incluindo cada vez mais diferentes fontes de rendimento na sujeição a taxas especiais, e a tributação por retenção na fonte a título definitivo foi generalizada a todos os rendimentos de capitais, desde que pagos por entidades com contabilidade organizada. E há ainda a salientar o aumento significativo destas taxas, como clara forma de obtenção de mais receita fiscal.
Tomando por referência apenas a tributação dos sujeitos passivos residentes em território português (para os quais o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora deste território), vamos analisar os três modelos de tributação previstos no CIRS: por englobamento, a taxas liberatórias e a taxas especiais.
O artigo 22.º do CIRS prevê a regra geral de que o rendimento coletável é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferidos em cada ano, depois de feitas as deduções e os abatimentos previstos para cada uma delas.
Logo a seguir, refere que não são englobados para efeitos da sua tributação os rendimentos referidos nos artigos 71.º e 72.º auferidos por residentes em território português, sem prejuízo da opção pelo englobamento neles prevista. Com isto se afasta o conceito de imposto global mas, para assegurar a ideia central do englobamento, permite-se que este se faça para vários rendimentos tributados por taxas específicas, desde que o seu titular manifeste expressamente essa vontade.
RENDIMENTOS SUJEITOS A TAXAS LIBERATÓRIAS
O artigo 71.º apresenta-nos as taxas liberatórias, que são taxas de retenção na fonte a título definitivo. Relativamente a sujeitos passivos residentes, as taxas liberatórias aplicam-se sobre rendimentos de aplicação de capitais, quando pagos por entidades que disponham de contabilidade organizada. Como a retenção na fonte a taxas liberatórias se traduz numa tributação a título definitivo, os sujeitos passivos que obtenham estes rendimentos ficam inclusive dispensados de os incluir na sua declaração de IRS.
Contudo, os residentes em território nacional podem optar por englobar, para efeitos da sua tributação, os rendimentos de capitais obtidos em território português e os rendimentos de valores mobiliários obtidos nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 71.º.
Importa então perceber em que situações a opção de englobamento poderá ser vantajosa para os titulares dos rendimentos que foram sujeitos à taxa liberatória de 28%.
Os rendimentos englobados por opção serão adicionados aos rendimentos de englobamento obrigatório, para serem sujeitos às taxas progressivas de 14,5%, 28,5%, 37%, 45% e 48%, previstas no artigo 68.º do CIRS.
Começando pelo caso particular dos lucros devidos por pessoas coletivas sujeitas e não isentas do IRC, o artigo 40.º-A do CIRS prevê que, cumpridos todos os requisitos, no caso de opção pelo englobamento, estes serão considerados em apenas 50% do seu valor, para atenuação da dupla tributação económica.
Feita a opção pelo englobamento, a retenção que tiver sido efetuada tem a natureza de pagamento por conta do imposto devido a final, o que permite a sua integral dedução à coleta de IRS apurada. Na prática, equivale a dizer-se que a retenção na fonte sobre os 50% dos lucros englobados foi feita à taxa de 56%. Um sujeito passivo que tenha obtido rendimentos sujeitos a taxas liberatórias apenas provenientes de lucros terá sempre vantagem em optar pelo seu englobamento pois a taxa a aplicar à metade do rendimento englobado será sempre inferior aos referidos 56%, e irá recuperar parte do excesso retido na fonte (seja através do aumento do reembolso de IRS, seja por diminuição do IRS a pagar).
Desde 2015, sempre que um sujeito passivo opte por englobar rendimentos fica obrigado a englobar a totalidade dos rendimentos da mesma categoria.
Numa situação de opção de englobamento de lucros, se o sujeito passivo tiver auferido no mesmo ano juros de depósitos bancários ou de obrigações, por exemplo, terá que englobar a totalidade destes rendimentos.
Sendo que os juros foram tributados à retenção de 28%, se a taxa a que ficam sujeitos com o englobamento for de 28,5% ou superior a opção mostra-se desfavorável para estes. Ainda assim, pode revelar-se vantajoso o englobamento deste conjunto de rendimentos (lucros + juros), desde que a poupança conseguida pela diferença de taxas nos primeiros seja superior ao agravamento de tributação gerado nos segundos.
Se o sujeito passivo auferir rendimentos sujeitos a taxas liberatórias que não incluam lucros, a análise poderá passar por três situações distintas:
― Sempre que os rendimentos de englobamento obrigatório já estejam a ser tributados no escalão dos 28,5%, naturalmente não haverá qualquer vantagem na opção pelo englobamento, pois a taxa liberatória a que já foram tributados é menor.
― Se os rendimentos englobados forem todos tributados a 14,5% não haverá qualquer dúvida que é vantajoso optar pelo englobamento.
― Mas se parte dos rendimentos englobados vierem a ser tributados a 14,5% e outra parte em escalões com taxas superiores, tudo dependerá da conjugação da poupança conseguida na tributação à taxa do primeiro escalão com o agravamento verificado na tributação à taxa de 28,5% e, eventualmente, de 37%.
RENDIMENTOS SUJEITOS A TAXAS ESPECIAIS
As taxas especiais de IRS estão previstas no artigo 72.º do Código. São taxas proporcionais que se aplicam sobre rendimentos de declaração obrigatória na modelo 3 de IRS. Alguns destes até podem ter sido sujeitos a retenção na fonte, mas esta é feita a título provisório. Nunca a título definitivo. Há que distinguir bem taxas liberatórias de taxas especiais: taxas liberatórias são taxas de retenção na fonte, que se aplicam aquando do pagamento dos rendimentos para os tributar, em princípio, a título definitivo, ficando por isso dispensados de inclusão na declaração de IRS; as taxas especiais são aplicadas apenas no momento da liquidação do IRS feita pela AT, sobre rendimentos de declaração obrigatória.
Consultando o artigo 72.º do CIRS verificamos quais os rendimentos sujeitos a taxas especiais e, por isso, dispensados de englobamento. Estes rendimentos, se obtidos por sujeitos passivos residentes, podem ser englobados por opção dos mesmos, com exceção das gratificações auferidas pela prestação ou em razão da prestação de trabalho, quando não atribuídas pela entidade patronal nem por entidade que com esta mantenha relações de grupo, domínio ou simples participação, independentemente da respetiva localização geográfica. Para verificação dos rendimentos sujeitos a taxas especiais, remete-se para o quadro que elaborámos e acompanha este texto.
Na opção de englobamento de rendimentos sujeitos a taxas especiais aplica-se a regra já referida que obriga ao englobamento de todos os rendimentos da mesma categoria. Daqui resulta que atualmente a opção faz-se categoria a categoria. Um sujeito passivo pode perfeitamente optar por englobar rendimentos de lucros (que foram sujeitos a retenção a taxa liberatória) e não englobar rendimentos prediais ou de mais-valias (sujeitos a taxas especiais) que tenha obtido no mesmo ano.
Na opção de englobamento de rendimentos referidos no artigo 72.º o valor a englobar será sempre o mesmo que está sujeito às taxas especiais, pelo que a análise da vantagem ou desvantagem do exercício da opção deve fazer-se atendendo aos cenários equivalentes já explicados.
Mas deve ser tido em conta um fator adicional e pouco conhecido. O IRS resultante da aplicação das taxas especiais não é considerado coleta, pelo que não beneficia das deduções à coleta previstas no artigo 78.º do CIRS, exceto as relativas a retenções na fonte.
Em sujeitos passivos que só obtenham rendimentos sujeitos a taxas especiais, pode ser vantajoso englobá-los, mesmo que tributados por exemplo a 37%, pois dependendo do montante de deduções à coleta existentes o valor final de IRS apurado pode ser inferior.
Mesmo em sujeitos passivos que tenham algum rendimento de englobamento obrigatório, este efeito positivo também pode verificar-se no caso de a coleta gerada por estes ser inferior ao montante de deduções potenciais.
RENDIMENTOS DE ENGLOBAMENTO OBRIGATÓRIO
O CIRS não nos indica explicitamente quais os rendimentos de englobamento obrigatório. Como referimos, a regra geral é que o rendimento coletável em IRS é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferidos em cada ano. Mas depois é apresentada a exclusão desta regra geral de englobamento para os rendimentos referidos nos artigos 71.º e 72.º.
Por isso, a forma de perceber quais os rendimentos de englobamento obrigatório passa por identificar quais os que estão sujeitos a taxas liberatórias e a taxas especiais para, por exclusão, concluir quais os que não estão afastados de englobamento, precisamente por não serem referidos nos artigos 71.º e 72.º. Assim, serão de englobamento obrigatório todos os rendimentos previstos no CIRC desde que não mencionados nestes dois artigos.
Para sua identificação, remetemos novamente para o quadro anexo que apresenta os diferentes tipos de rendimentos sujeitos a IRS agrupados pelas três formas de tributação previstas no Código, em articulação com a possibilidade de opção pelo englobamento, quando aplicável.
Para finalizar, socorremo-nos novamente do preâmbulo do CIRS onde lemos também que “a introdução da progressividade em estruturas cedulares representa uma tentativa de pessoalização que acarreta inevitáveis e sérias distorções. Materializada apenas em uma das cédulas, suscita cargas fiscais diferentes para contribuintes com rendimento idêntico, consoante a respetiva fonte se concentre nessa cédula ou se localize em qualquer das demais; operada uma correção por via da generalização de tabelas de taxas progressivas às diferentes cédulas (a admitir que tal fosse tecnicamente possível), ainda assim subsistiria uma injustificável diferença de tratamento entre os contribuintes cujo rendimento provém de uma só fonte e os titulares de rendimentos de origem múltipla.”
Com o modelo do rendimento global líquido introduzido no CIRS, de forma a sujeitar todos os rendimentos a uma única tabela de taxas progressivas, pretendeu-se diminuir as referidas distorções e caminhar num sentido de uma maior equidade pois, como transcrito inicialmente “só a perspetiva unitária permite a distribuição da carga fiscal segundo um esquema racional de progressividade, em consonância com a capacidade contributiva.”
Indo um pouco mais além da explicação técnica que pretendemos deixar neste artigo, e tendo presentes os referido objetivos do IRS, calculemos a tributação de duas pessoas diferentes, cada qual com 100.000 € de rendimento coletável, sendo que uma apenas aufere rendimentos da categoria A e a outra apenas tem rendimentos da categoria F. A mesma capacidade contributiva, tributação substancialmente diferente…
------------------------------
Também em versão PDF para ser mais fácil guardar e imprimir: